Telas da Vida

Imagino-me perdido em um universo futurista e paralelo, distante do comum, mas não do real. Talvez até mais real que muitas coisas concretas na vida. Estou eu falando de um outro tipo de realidade.
As luzes da televisão refletiam na roupa de cama desfeita criaturas robóticas, deixando cada personagem um tanto quanto nítido e ao mesmo tempo deformado.
Bons momentos eram aqueles que eu podia pressionar um botão. De tamanha reluzente beleza, aquele botão chamava-me à jogatina. Falo de meu console. Mesmo que pareça estranho, a atmosfera das batalhas, a caminhada rumo ao castelo ou a qualquer coisa ou outra que fosse faziam-me sempre feliz e completo.
Assim vivi por muito tempo. Cada ser místico que surgia, não importando se segurava uma espada, se possuía um braço biônico altamente poderoso, ou ainda, se trazia consigo a coragem, dom tanto maior ou igual ao do célebre rei dos jogos, era para mim a fortaleza sólida que me fazia seguro e confiante.
Algumas das vezes sentia-me o próprio a estar destruindo o inimigo, descobrindo novos enigmas, caminhando arriscadamente para a conquista de cada objetivo, por menor que fosse... E hoje posso afirmar com toda certeza que o personagem nada mais era do que o meu único reflexo na tela. Invertemos posições. Ao passo que ele refletia-se em meu quarto, estava eu refletindo-me nele, já que suas ações partiam de mim.
E esta foi a realidade que tive há muito tempo. Eu e um joystick, apenas. Pode-se chamar de realidade sim, pois minha vida resumia-se a isso. E, por incrível que pareça, a de todos também. A vida é exatamente como um jogo, controlada pelos que possuem a única forma de fazê-lo. Também eu controlava a minha, mesmo vivendo dentro de uma pequena televisão. Afinal, tanto homens quanto personagens... Sozinho é que eles nada fariam.